patrimonialismo e a luta fundiária no Brasil: Como enfrentar o racismo fundiário?


Imagem Google. Desconhecido.

GOMES,
Tatiana Emilia Dias. Direitos territoriais quilombolas e enfrentamentos ao racismo fundiário. II Ciclo de Encontros em História do Direito. 23/08/2022. UFSB, Porto Seguro, BA. Palestra transmitida via Google Meet.

A professora, mestre em Sociologia e Direito e doutoranda em Criminologia Tatiana Gomes possui experiência considerável com as populações quilombolas, resultado de muito estudo, “inquietações e leituras” (na palavra da palestrante) e atuação junto a estes povos. O evento intitulado “Direitos territoriais quilombolas e enfrentamentos ao racismo fundiário” faz parte do II Ciclo de Encontros em História do Direito.

“Onde houve escravização, houve resistência”, disse Gomes. Inicialmente, a professora traça um panorama histórico das experiências quilombolas em outros países, cita em especial as tidas nas colônias francesas e espanholas. No caso brasileiro, objeto de suas suas reflexões e escritos, a pesquisadora perpassa pelos séculos XIX e XX, especialmente nas comunidades de senzalas, no direito quilombola e na luta agrária.

Tatiana Gomes desenvolve o conceito de “racismo fundiário", expressão que busca explicar as ações violentas da elite branca contra as populações negra e indígena (corpos, cultura, território) ao impedir estes de terem acesso aos direitos jurídicos e de territórios. 

Nas palavras ditas por Gomes na palestra: “a concentração de terras no Brasil tem cor”. É sabido que a  construção da nação brasileira passou pelo período da escravidão. Tendo a escravização abolida, os negros não foram incluídos efetivamente na sociedade, deixados à sorte.

Segundo Antonio Wolkmer, houve no Brasil do século XIX um “liberalismo pátrio”, um liberalismo à brasileira que possuía contradições. O liberalismo brasileiro não respeitava a autonomia do indivíduo, representação política, efetiva separação de poderes, soberania popular, cidadania e liberdade, Estado de direito (p. 74-75).

Esse "liberalismo" era um discurso oficial da elite então dominante no país, que por outro lado desprestigiava as populações negras e indígenas (p. 76). Junto ao “liberalismo pátrio” havia a prática do patrimonialismo, caracterizado pela indistinção entre esfera pública e privada, praticada quando os governantes agem em benefício privado, ao favorecer a manutenção de privilégios das elites em ambas as esferas do governo. Isso faz parte da formação da sociedade brasileira, assim como também a formação dos quilombos, o esquecimento dessas populações por parte do Estado.

Tatiana Gomes apresentou durante o evento dados do Censo Agropecuário 2017 do IBGE. A concentração de terras no Brasil é de 0,8 numa escala de 1,0, que significa concentração máxima de terras, disse. Ao longo das últimas décadas a média sempre se manteve em 0,8 no país. Parte da formação do Estado brasileiro, esses indicadores demonstram a falta de acesso aos direitos jurídicos e territoriais por parte dessas populações. Como disse a professora Gomes: “O estado tem o dever de salvaguardar via titulação de territórios e promoção de políticas públicas”.

Num país com uma história como a nossa, a concentração de terras e notícias como lutas por território é vergonhoso vermos ainda hoje. Mas se faz necessário. Portanto, deve ser enfrentado com os instrumentos da justiça e do direito. Dentre outras coisas ocorridas durante o evento, houve momento de perguntas e respostas, discussões sobre o cenário institucional e social atuais. Foi uma noite muito construtiva e esclarecedora.


Referência👇

¹WOLKMER, Antônio Carlos. História do Direito no Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2019. Cap. III. Estado, elites e construção do Direito nacional.

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