Entre contradições: o Brasil e o mundo desiguais
O Artigo 153, inciso VII da Constituição Brasileira é o único que faz menção a taxação de grandes fortunas no nosso país. Digo único pois a contar de clara previsão constitucional, não há implementação do artigo no sistema tributário nacional. No entanto, a sociedade anceia e os especialistas salientam: é preciso cobrar mais de quem tem mais e ganha mais. Assim como a tributação, a distribuição de renda no país é injusta em relação a pobres e ricos.
Veja quão desigual é o Brasil. Recentemente, tive a agridoce surpresa (explico o porquê no final) de por curiosidade ter lido a nota fiscal após compra numa farmácia e me espantei com o valor da tributação constante no fim do documento. A soma total do valor dos tributos incidentes sobre a minha compra foi um pouco mais de 20%, somando tributos federal e estadual. Ou seja, quem ganha renda maior que eu pagará, em proporção, menos tributos. Por outro lado eu que ganha menos, pagará em proporção, muito mais do que o outro. Entendeu o centro da questão? Pesquisei e descobri que isso ocorre devido a chamada tributação sobre o consumo.
Sobre a concentração de riqueza e desigualdade econômica, agora em contexto macro - isto é, planetário -, pensou o filósofo e sociólogo polonês Zygmunt Bauman em seu livro A riqueza de poucos beneficia a todos? (2015). Especialmente no capítulo primeiro intitulado "O quanto somos desiguais?", Bauman nos trás um rico panorama detalhado da acentuação das disparidades econômicas entre pobres e ricos a partir de 1980. Ele conclui que a soma das riquezas das cem pessoas mais ricas do muno são duas vezes maior que a riqueza dos mais de dois bilhões de pessoas mais pobres. E complementa:
"Segundo o World Institute for Development Economics, com base em Helsinque, as pessoas na faixa do 1% mais rico da população mundial são quase 2 mil vezes mais ricas que aquelas na faixa dos 50% da faixa inferior da escala" (Bauman, 2015, p. 16).
Ademais, reflete sobre as consequências desse sistema desigual. Cita como exemplo a diferença salarial entre carreiras, a desigualdade de gênero, as disparidades de oportunidades (meritocracia) e a globalização - onde aí se inclui a exploração da mão de obra barata, e as multinacionais, etc. Cita também exemplos de aumento da concentração de renda nos Estados Unidos e no Reino Unido para promover o debate acerca das desigualdades.
Chama-me atenção a globalização. Lembro-me das histórias do continente África e a própria brasileira. O continente Africano foi cruelmente vilipendiado na História, não apenas entre os período das Grandes Navegações, sobretudo pelo período pelos historiadores chamados de Imperialismo ou Neocolonialismo. Todos os recursos para o desenvolvimento dos países africanos foram tirados de si. A média do continental do índice de desenvolvimento humano (IDH) não passa de 0,6. Segundo reportagem de 2019 da BBC Brasil (dados de 2015, Banco Mundial), a pesar de estar em declínio milhões de pessoa ainda vivem na linha ou abaixo da pobreza, e atinge principalmente países da África e leste da Ásia.
A voltar para o caso brasileiro penso que o país muitas vezes subordina-se a ditos de outros países - em especial aos Estado Unidos. Isto é, se não ainda hoje, até o fim do século XX o nosso país (assim como maior parte da Ibero-América) deixava de atentar para as questões sociais históricas internas para servir a interesses estrangeiros, em especial às multinacionais. Precisamos pensar em outro modo de globalização, sem fome, sem exploração, escravidão, sem medo. Uma globalização não perversa como diria o ilustre geógrafo baiano Milton Santos.
Saliento, entre outros fatores o principal empecilho à diminuição das desigualdades no Brasil é a má e injusta distribuição de impostos e tributos. Independente do grau de desenvolvimento de um país as desigualdades podem coexistir com a sua riqueza, o que em certo ponto é paradoxal. Segundo reportagem do jornal eletrônico UOL - de 9 de dezembro de 2019, nosso país é atualmente o sétimo mais desigual do mundo (imagem 3), ficando atrás de países como África do Sul, Namíbia e Zâmbia. Em oposição, é a nona maior economia do mundo com cerca de 1,9 trilhões em dólares, e seu índice de desenvolvimento humano é cerca de 0,761 - considerado alto pela Organização das Nações Unidas. Interessante, pois precisamente é a partir de 1990 que o IDH do Brasil começa a crescer (imagem 4), e no mesmo período analisado por Bauman em seu livro.
REFERÊNCIAS:
BAUMANA, Zygmunt. A riqueza de poucos beneficia a todos? Tradução: Renato Aguiar. - 1° edição. Rio de Janeiro: Zahar, 2015. capítulo 1, p. 15 - 28.
BERMÚDEZ, A. C. et al. Brasil é o sétimo país mais desigual do mundo, melhor apenas do que países africanos. UOL. 9 de dez. 2019. Disponível em:<https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2019/12/09/brasil-e-o-7-mais-desigual-do-mundo-melhor-apenas-do-que-africanos.htm> Acesso em: 10 de set. de 2020.
BRASIL.[Costituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF. Presidência da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em: 10 de set. de 2020.
Imposto sobre consumo. OXFAM Brasil. Publicado no Youtube, duração 1 min. 7 de nov. de 2019. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?time_continue=59&v=YeGMFaLov2c&feature=emb_title> Acesso em: 10 de set. 2020.
SANTOS, Miltom. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: BestBolso; 2011.
UCHOA, Pablo. A pobreza está mesmo diminuindo no mundo? BBC News Brasil. 27 de out. de 2019. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-50077214#:~:text=Em%20menos%20de%20uma%20gera%C3%A7%C3%A3o,9%20bilh%C3%A3o%20para%20735%20milh%C3%B5es.> Acesso em: 15 de set. de 2020
Comentários
Postar um comentário