Comunidade: entre o ser e o nada
Facebook, Instagram, Twitter, Whatsapp, Telegram, Youtube, Linkeddim… Ufa! São tantas as mídias e redes sociais que quem está inserido no mundo virtual sente-se estressado ou mesmo pressionado para que consumamos elas, como eu. Costumeiramente as chamamos de “comunidades virtuais”. Mas como assim "comunidades"? Realmente são? O que as caracteriza? Existem coomunidade?
Quem busca o conceito e analisa a “comunidade” é um dos mais importantes e influentes pensadores das últimas décadas, o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman (1925-2017) (imagem 1) em sua obra “Comunidade - A busca por segurança no mundo atual” (2003) (imagem 2). Para não me alongar, irei direto aos pontos indispensáveis nessa reflexão.
Imagem 1: Zygmunt Bauman. Imagem Quero Bolsa/reprodução.
Imagem 2: Capa do livro "Comunidade - A busca por segurança no mundo atual". Bauman, 2003. Imagem Amazon/reprodução.
Por comunidade, Bauman entende que é uma palavra que traz nos indivíduos um sentimento de pertencimento, aconchego, proteção, segurança, reciprocidade etc. (BAUMAN, p. 9). Caracterizadas pela distinção (o que diferencia essa tal "comunidade" de outras), pequenez (número reduzido de pessoas) e autossuficiência (todos os membros encontram neles mútuo apoio e segurança), uma comunidade seria uma união/grupo de pessoas em que o objetivo maior seria a solidariedade e a amizade mútua entre os membros; o consenso seria um dos fundamentos, além das regras de conduta etc.
Se você, caro leitor, ao ler o termo comunidade logo o associou aos conjuntos habitacionais (populares), condomínios, grupos religiosos ou filantrópicos, saiba que, de acordo com Bauman, essas "comunidades" não são reais, tangíveis ou verdadeiras. Parece um absurdo, não é mesmo? Ocorre que hoje, o uso do termo “comunidade” tornou-se muito corriqueiro, em outras palavras “comum” pelo uso irrefletido e em excesso.
Em verdade para Bauman a “comunidade”, em sentido pleno, inexiste. O “paraíso” perfeito está distante de nossa realidade. Em outras palavras, o pensador considera a busca pela comunidade normal e comum, mas encontra-la é utópica; bem como ele se refere, “esquiva” (p. 7). Mas porquê a "comunidade" é utópica, irrealista? Para o pensador, viver em comunidade gera um conflito entre liberdade e segurança. A segurança é a certeza de pertencimento, auxílio; mas exige o cumprimento de regras, diminuição da liberdade individual.
Bauman argumenta que a liberdade e a segurança podem viver em equilíbrio, mas não se pode ter ambas em plenitude, visto que uma anula a outra. Uma vez que viver em comunidade exige abrir mão de um certo nível de autonomia (liberdade) - ainda que haja segurança - não permite aos indivíduos serem eles mesmo. Aqui há o conflito entre o ser (a liberdade/autonomia individual) e o nada (ou pouca liberdade em detrimento da segurança).
A promoção da segurança sempre requer o sacrifício da liberdade, enquanto esta só pode ser ampliada à custa da segurança. Mas segurança sem liberdade equivale a escravidão (e, além disso, sem uma injeção de liberdade, acaba por ser afinal um tipo muito inseguro de segurança); e a liberdade sem segurança equivale a estar perdido e abandonado (e, no limite, sem uma injeção de segurança, acaba por ser uma liberdade muito pouco livre). Essa circunstância provoca nos filósofos uma dor de cabeça sem cura conhecida. Ela também torna a vida em comum um conflito sem fim, pois a segurança sacrificada em nome da liberdade tende a ser a segurança dos outros; e a liberdade sacrificada em nome da segurança tende a ser a liberdade dos outros (BAUMAN, p. 24).
Tudo a ver com as nossas relações atuais, não é mesmo? Inclusive com as mídias sociais abordadas no início. Bauman dialoga perfeitamente com autores e ideias trabalhadas em postagens anteriores. Confira! Afinal, pensar nos faz bem.
Referências👇👀
BAUMAN, Zygmunt. Comunidade - A busca por segurança no mundo atual. Tradução: Plínio Dentzien. Zahar: Rio de Janeiro, 2003, 136 pp. [recurso eletrônico]. Disponível em: https://observatorio03.files.wordpress.com/2010/02/bauman_zygmunt_-_comunidade1.pdf Acesso em: 25/06/2021, 10h 22 min.
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